terça-feira, 25 de março de 2014

Ano 1964 x Democracia

                       Devemos ser honestos primeiramente conosco,  com nossa consciência.
                       Não sou partidário,  seja de direita,  esquerda ou qualquer que seja,  aliás, a política nos dias de hoje virou uma indigesta pizza.
                       Cheguei a Porto Alegre,  vindo do interior em 1967,  com 13 anos. Estávamos no período da ditadura militar e logo no ano seguinte,  com 14 anos,  além de estudar,  comecei a trabalhar com Carteira de Trabalho de Menor assinada.
                        A ditadura não afetou em nada minha vida de estudante,  trabalho e lazer,  muito pelo contrário,  tinha segurança em qualquer lugar. No ano de 1973,  fui para o Rio de Janeiro,  também para estudar e trabalhar e é claro tinha meu divertimento.
                         Lembro de dois lemas: "Brasil : ame-o ou deixe-o",  e outro "sabendo usar não vai faltar" . Os problemas foram os exageros praticados de ambos os lados,  com roubos,  sequestros,  torturas e mortes. Hoje ainda pagamos uma conta que passa do bilhão em indenizações,  sendo que em minha opinião na maioria indevida,  pois não houve luta pela volta da democracia,  simplesmente um grupo ou parte da população não aceitava a mudança. Foi a anistia e o movimento das "diretas já",  pacífico e ordeiro que iniciou a luta pela redemocratização.
                          Hoje vejo uma falsa democracia,  na verdade uma ditadura financeira que se instalou em Brasília e não quer largar. Acredito que a maioria do brasilero que paga cada vez mais impostos também não está satifeito com o que vivemos hoje.
                           Gostaria de acreditar em um Brasil verdadeiramente democrático como diz em nossa bandeira : "Ordem e Progresso",  mas será que da forma que caminhamos,  chegaremos a "esta Ordem e a este Progresso" ?

                           Guido J. Scalabrin.

terça-feira, 4 de março de 2014

A QUINA


                                                                                                        (Contos Antigos)
                                                                                                         Lotário Neuberger

                         Um dia como qualquer outro , de movimento normal , entrou um cliente na agência. Olhou ao redor. Leu as sinalizações. Dirigiu-se , decidido , para "Abertura de Contas".
                          _ Quero abrir uma conta..._ foi falando.
                          _ Pois não! Que tipo de conta? _ perguntou o escriturário.
                          _ Tipo?!...Poupança... Caderneta de Poupança da Caixa Econômica Federal.
                          _ Tomou assento , esperando por novas indagações.
                          _ Trouxe os documentos? _ voltou o escriturário.
                          O cliente puxou do bolso uma Carteira de Identidade , meio amassada. Servir? Ah, servia.
                          Nunca abri conta na minha vida _ disse o cliente , que se chamava João Ribeiro da Silva  e
tinha 48 anos de idade , embora aparentasse ter mais.
                           Praticamente preenchida a ficha de abertura da conta , o cliente desandou a falar.
                           _ Passei muitas vezes aqui em frente , mas nunca tive coragem para entrar e abrir uma conta. Quanto vou depositar? Pouquinho. Mil cruzeiros. É só para abrir. Mas como eu ia falando ,  eu  não
tinha coragem para entrar porque sempre tive pouco dinheiro.
                           _ Não importa o valor do depósito. O importante é começar a economizar e depositar na poupança. Nunca é tarde.
                           _ Pois é. Mas como eu ia dizendo... De repente , tive um pressentimento de que iria acertar na Loto. A Quina... Achei que seria bom já ter uma conta na Caixa.
                           _ Sempre é bom !
                           O cliente efetuou o depósito e foi embora.
                            Depois que o cliente dobrou a esquina todo mundo da agência caiu na gargalhada. "Abrir conta porque acha que vai tirar a Quina". "Ponha esperança nisso !"
                            Passou-se uma semana. O cliente voltou à agência.
                            Nessa altura dos acontecimentos todos da agência já sabiam o nome dele , pelo menos. Foi direto ao escriturário que abriu a conta.
                            _ Como vai , seu João?
                            _ Bem !
                            _ E...
                            _ Ainda não acertei. Mas um dia desses...
                            _ Um dia.
                            _ Agora eu queria  é depositar mais um pouco.
                             Assim , semanalmente , sempre às segundas-feiras , seu João Ribeiro da Silva voltava à agência. Sempre falava com o mesmo escriturário e sempre depositava certa importância , mesmo pequena. E...
                            _ Mas um dia desses vou acertar.
                            Passaram-se semanas , meses. E o cliente conquistou a simpatia de todos os empregados da agência , pela sua maneira simples de ser. Até que um dia:
                            _ Acertei o terno! vibrava.
                            E todo mundo vibrou com ele , num gesto de inteira simpatia.
                            _ Minha sorte esta começando!
                            Depositou o valor do terno na poupança e foi embora.
                            Voltava todas as semanas. Mas a mesma sorte não se repetiu. Uma coisa era certa: a esperança dele de acertar a Quina não cedia. Continuava apostando e continuava depositando.
                            Certo dia , não no habitual , mas numa sexta-feira , seu João veio à agência. Todo mundo estranhou. Mas porque estranhar? às sextas saía o resultado da Loto.
                            _ Acho que acertei !
                            _ É mesmo?!
                             Todo mundo ficou eufórico. Era uma alegria geral , pela sorte do cliente. Talvez mais satisfação por estarem com um milionário. O gerente da agência começou a verificar o que podia fazer pelo cliente. Ainda mais pensando em manter o depósito na agência , ou a maior parte dele.
                             Consultou manuais. Telefonou.
                             Todo mundo falava , chegando a abandonar seus postos na agência. Os outros clientes nem eram atendidos.
                             Eles também rodeavam o acertador. João Ribeiro da Silva apenas sorria. Passou um bom tempo quando pediu para se sentar. Começou a falar , rodeado por todos.
                             _ Eu acertei. Vi hoje. Foi há dois anos.
                             Todo mundo ficou inquieto.
                             _ Mas então passou o prazo ?
                             _ Não! _ disse o cliente , enquanto alguns já começavam a se afastar , decepcionados. _ Esperem !... Foi há dois anos. Foi quando abri a poupança. Hoje verifiquei.
                             _ O saldo da poupança é igual a quadra. Então? Acertei ou não acertei? Todo mundo teve que admitir que sim. Foi economizando que o cliente conseguiu uma soma razoável em dinheiro , de forma sistemática e programada.
                             _ Vai parar de apostar ? Foi a pergunda geral.
                             _ Não! Vou continuar depositando e apostando. Um dia desses ainda tiro a Quina !